O direito à educação inclusiva é um tema de grande importância e relevância no cenário jurídico brasileiro. É possível observar um arcabouço normativo que garante a educação inclusiva, cujo objetivo é a igualdade de oportunidades e a não discriminação no processo de matrícula de alunos com deficiência em instituições de ensino.
A Constituição Federal de 1988 e a Lei Brasileira da Inclusão (Lei 13.146/2015) estabelecem a obrigatoriedade das escolas, sejam públicas ou privadas em promoverem a inclusão de pessoas com deficiência no ensino e garantir o acesso à educação, sem qualquer tipo de discriminação, além de prevê a necessidade de adaptações e flexibilizações para garantir a inclusão desses alunos.
No entanto, é importante ressaltar que, apesar da existência de leis e jurisprudências que garantem o direito à educação inclusiva, não é raro encontrarmos obstáculos de instituições de ensino, sejam públicas ou privadas para efetivar a matrícula de alunos com deficiência, angustiando a família e, por vezes, querendo jogar a responsabilidade nos pais. Isso pode gerar impactos mais intensos e lesivos, considerando a vulnerabilidade e as dificuldades de adaptação social dessas crianças.
Nesse sentido, é fundamental que os pais ou responsáveis por crianças com deficiência estejam atentos aos seus direitos e busquem a garantia do acesso à educação inclusiva. Em casos de descumprimento da legislação, é possível recorrer à justiça para garantir a matrícula e a inclusão desses alunos.
Recentemente, o Escritório Ana Lúcia de Oliveira Advogados Associados teve êxito em um processo que envolve, justamente este tema, pois a ré, escola particular condicionou a efetivação da matrícula da criança ao período de avaliação prévia, em razão do seu diagnóstico de pessoa com transtorno do espectro autista, conforme ementa:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. TRATAMENTO DIFERENCIADO NO PROCEDIMENTO DE MATRÍCULA DE ALUNO NO ESPECTRO AUTISTA. INSTITUIÇÃO PARTICULAR. DIREITO À IGUALDADE E VEDAÇÃO AO TRATAMENTO DISCRIMINATÓRIO. CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. OBRIGAÇÃO DE INSERÇÃO E ADAPTAÇÃO. CONDICIONAMENTO DA MATRÍCULA À PERÍODO DE TESTE. IRREGULARIDADE. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. DANOS MORAIS. QUEBRA DE EXPECTATIVA, ANGÚSTIA E INSEGURANÇA. IMPACTOS MAIS INTENSOS E LESIVOS DIANTE DA VULNERABILIDADE E DIFICULDADES DE ADAPTAÇÃO SOCIAL DA CRIANÇA. SOFRIMENTO PSÍQUICO E OFENSA À DIGNIDADE. LESÃO À DIREITO DA PERSONALIDADE. INDENIZAÇÃO DEVIDA. SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO NÃO PROVIDO.
– Diante da falha na prestação dos serviços, o fornecedor responde pelos danos causados ao consumidor, independente de culpa, salvo provada a caracterização de alguma das excludentes do §3º.
– Fundado o pleito indenizatório inicial em conduta irregular de instituição de ensino que teria criado óbice à efetiva matrícula de criança diagnosticada no espectro autista, cabe à parte autora a comprovação da falha na prestação dos serviços e dos danos alegados.
– O Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146, de 2015) estabelece a obrigatoriedade das escolas privadas promoverem a inserção de pessoas com deficiência no ensino regular e prover as medidas de adaptação necessárias, sendo vedado o tratamento discriminatório e garantido o acesso à educação, nos termos da referida lei e da Constituição Federal de 1988.
– Comprovado nos autos que, além da avaliação imposta pela instituição de ensino requerida a todos os alunos, a matrícula do autor foi condicionada a período de teste, após o qual poderia não ser efetivada, em razão de seu diagnóstico, resta verificada a adoção de tratamento diferenciado e, assim, a falha na prestação de serviços da requerida.
– A reparação por danos morais deve efetivamente reparar um dano concreto decorrente da violação a direitos da personalidade, como v. g. direito ao nome, à honra, à imagem, à privacidade e intimidade, direito ao seu próprio corpo e à sua integridade física (arts. 11 a 21 do CC), que seja capaz de causar dor, humilhação, constrangimento ou sofrimento à vítima do dano. À exceção do dano moral in re ipsa, sem a prova desse dano não há falar-se em indenização.
– Demonstrado que a situação desencadeada pela conduta da requerida, que demandou, diante na incerteza na matrícula, nova mudança de escola, gerou na criança quebra de expectativa, insegurança e angústia capazes de desestabilizá-la, considerando sua atipicidade, de uma forma mais intensa e lesiva do que uma pessoa neurotípica, devida a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais, uma vez afetada a dignidade do autor e causado sofrimento psíquico e assim, lesão aos seus direitos da personalidade.
– Recurso não provido. BRASIL. Tribunal de Justiça de Minas Gerais TJ-MG – APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0000.18.108001-1/003. 11ª Câmara Cível. Ibirité. Relator: Rui de Almeida Magalhães.
No julgamento acima o Tribunal de Justiça de Minas Gerais destacou a importância da comprovação da falha na prestação dos serviços e dos danos alegados. Isso significa que, diante do pedido de danos morais, comprovamos que houve um dano concreto decorrente da violação dos direitos de personalidade da criança, como o direito ao nome, à honra, à imagem, à privacidade e à integridade física.
Além disso, é importante ressaltar que, em casos de dano moral, é necessário que haja uma comprovação do sofrimento psíquico causado à vítima. No caso em questão, a situação desencadeada pela conduta da instituição de ensino gerou na criança quebra de expectativa, insegurança e angústia, o que pode desestabilizá-la de forma mais intensa e lesiva de que uma pessoa neurotípica. Portanto, é fundamental que as instituições de ensino cumpram com suas obrigações legais e garantam a inclusão de alunos com deficiência com os direitos à acessibilidade. Caso haja descumprimento, é possível recorrer à justiça para garantir o direito à educação inclusiva e analisar pedido de danos morais. É importante que uma sociedade esteja atenta e engajada na luta pela inclusão e igualdade de direitos para todos.
ANA LÚCIA DE OLIVEIRA
Fundadora do Escritório Ana Lúcia de Oliveira Advogados Associados